terça-feira, 14 de agosto de 2012

"Silêncio". Novo livro de Manuel Pedro Dias


AOS LEITORES
 O conflito armado que eclodiu no Ultramar português no início da década de 60 e que se manteve durante 13 longos anos, provocou, na grande maioria da sociedade portuguesa, profundas feridas que ainda hoje, muitas delas, se encontram por sarar.
 Não foram só os cerca de 9 000 mortos, bem como os milhares de feridos, as únicas vítimas daquela guerra indesejada aliás, todas o são.
Há que levar em linha de conta as famílias daqueles militares que, de modo diferente, também sofreram as agruras provocadas pela ausência dos seus entes queridos, em cujas condições e perigos em que viviam lhes eram totalmente desconhecidos. A angústia estava sempre presente: Foram as mães, as eternas e sempre sofredoras mães, acerca das suas condições de “guerreiras” de retaguarda já muito, felizmente, foi escrito, nós próprios o fizemos por diversas vezes; as esposas, muitas delas já com filhos, quando os maridos partiram, enfrentando de forma estóica a sua ausência, que, infelizmente, em muitos casos foi eterna; as noivas, sobre estas muito pouco se tem falado e o que foi dito, logo no início da revolução dos cravos, por pseudo escritores vanguardistas, era para atingir a sua honra, rotulando, a grande maioria, de infiéis.
Sempre nos insurgimos contra esta tremenda injustiça, quer em artigos que escrevemos em revistas da especialidade, quer ainda verbalmente nas várias tertúlias em que temos participado.
É do conhecimento geral que durante o período atrás referido a juventude masculina era praticamente toda mobilizada para combater nas três frentes de batalha: Angola, Guiné e Moçambique. Mas este factor, em nosso entender, não era condição “Sine qua non” para que a sua ausência fosse sinónimo de infidelidade por parte das mulheres. Nos dias de ontem, de hoje e de sempre, as “traições” existiram e continuarão a existir, não só por parte das mulheres, mas também dos homens, porque, então, confiná-las a um período específico? Pura maldade.
Foi ao voltar a ler essas injustas maledicências que nos ocorreu a ideia de enaltecer essas jovens que, de forma séria, souberam esperar, também com privações de muita ordem, pelos seus namorados ou maridos e também aquelas que por infortúnio destes, souberam honrar para sempre a sua memória. 
Devemos confessar que o nosso propósito era, somente, abordar este tema num mero artigo de opinião.
Mas, com o decorrer da escrita, fomo-nos apercebendo que podíamos ir mais além do que o simples artigo imaginado.
Assim, nasceu nova ideia: Abalançar-nos num trabalho mais amplo, tendo sempre como principal objectivo não fugir do pensamento inicial. 
Não obstante a história que se apresenta ser mera ficção, pelo que, qualquer semelhança entre os nomes referidos e a realidade ser pura coincidência, o certo é que, na verdade, a ficção ultrapassa, por vezes, a realidade.
Por nos parecer pertinente e para mais fácil entendimento, decidimos fazer uma breve apresentação das duas personagens principais que fazem parte desta história:
Miguel
Rapaz mobilizado, como furriel miliciano, para combater na Província de Moçambique. Toda a sua vida foi passada entre Vila Nova da Ribeira, de onde era natural e a sede do Concelho, onde estudara. As suas habilitações literárias, permitiram-lhe ingressar no Curso de Sargentos Milicianos.
Partiu para Moçambique, deixando na terra natal uma paixão inicialmente não correspondida. As suas lutas dividiam-se entre a conquista desse seu grande amor e combater o inimigo na grande imensidão das matas do Niassa, onde a sua unidade se encontrava estacionada num antigo aldeamento, já sem população, Xituengo.
e 
Mariana
 Que, apesar de sempre ter vivido na sua terra natal, era uma rapariga com alguma cultura já que os pais, que viviam do sustento das terras, com um certo esforço financeiro, conseguiram custear as despesas para que a filha estudasse em ensino particular na própria vila, obtendo assim o 2.º ciclo liceal. Além disso, era uma apaixonada pela leitura.
Enquanto não arranjava emprego na capital, era esse o seu desejo, foi permanecendo em Vila Nova da Ribeira.
Quer Miguel, quer Mariana, dado o seu gosto pela poesia, na troca de correspondência faziam-no, praticamente sempre em verso, embora, por vezes, a métrica poeto-silábica não fosse cumprida com rigor. Facto perfeitamente compreensivo dado o seu amadorismo nesta vertente literária.    
 “Silêncio” foi a primeira palavra que nos ocorreu ao pensamento para dar o título a este despretensioso livro. Posteriormente, pensámos noutros vocábulos mas, com o decorrer da escrita, o “Silêncio” foi ganhando forma, devendo ser, no entanto, interpretado num sentido lato da palavra e não limitá-lo a um só único significado.
Conseguimos, assim o julgamos, pois foi esse o nosso objectivo, que Mariana fosse paradigma e representasse as milhares de jovens que na geração de 60 e parte da de 70, que por cá ficaram aguardando, como já referimos, privando-se dos passatempos inerentes à sua juventude, enquanto lá longe, muito longe, se combatia.  
Este livro foi pensado também para dignificar os militares, na personagem de Miguel que, de algum modo, tão mal tratados foram em termos de conceito por certas franjas da nossa sociedade a qual, em certos casos, navega em termos de opinião, ao sabor das suas próprias conveniências políticas. Estas, por vezes, mudando de rumo de acordo com a direcção do vento.
Infelizmente, temos que admitir que a Guerra do Ultramar foi e continua a ser para as tutelas que nos têm e continuam a governar, um tema “maldito”.
Quer eles queiram, quer não, isso é um facto irrefutável, a Guerra do Ultramar faz parte da História Lusíada.
Assim, quem nela participou, tal como nós, não deve envergonhar-se em afirmá-lo.
Mas porquê falar dela com desprezo? Não sabemos.
Da nossa parte continuaremos, enquanto a mente não nos atraiçoar, a escrever, sem complexos, sobre o tema.
O Autor

3 comentários:

Antonio S. Leitão. disse...

Quando em Maio de 71 eu trampus o limiar do RI 14, se soubesse que em Maio de 54 ja o exercito Francês sofria uma pesada derrota na Indochina que teria de abandonar com dezenas de milhar de mortos, e que seguidamente teria a guerra da Argelia, que em suma, quando a guerra começou nas colonias portuguesas ja a Africa era quase toda independente... fariam de mim gato sapato, mas mais dificilmente.

Antonio S. Leitão. disse...

Quando em Maio de 71 eu trampus o limiar do RI 14, se soubesse que em Maio de 54 ja o exercito Francês sofria uma pesada derrota na Indochina que teria de abandonar com dezenas de milhar de mortos, e que seguidamente teria a guerra da Argelia, que em suma, quando a guerra começou nas colonias portuguesas ja a Africa era quase toda independente... fariam de mim gato sapato, mas mais dificilmente.

Antonio S. Leitão. disse...

Quando em Maio de 71 eu trampus o limiar do RI 14, se soubesse que em Maio de 54 ja o exercito Francês sofria uma pesada derrota na Indochina que teria de abandonar com dezenas de milhar de mortos, e que seguidamente teria a guerra da Argelia, que em suma, quando a guerra começou nas colonias portuguesas ja a Africa era quase toda independente... fariam de mim gato sapato, mas mais dificilmente.