Embora já os tivesse lido vezes sem conta, considerava-os um pedaço de mim e dos quais não me queria separar.
Com a chegada da C.CAÇ. 3309 a Nangade, no norte de Moçambique, tratei logo de arranjar uns cunhetes de munições do Obus 14 vazios, e deles fazer uma estante, alinhando-os de forma a que todos os que coabitavam naquela caserna os pudessem folhear como se tratasse de uma "biblioteca pública", tendo por companhia outros exemplares, que mais tarde outros soldados se prestaram a preencher o espaço ainda vazio daquelas caixas de munições.
De todos os livros que levei (onde imperava a variadade de temas para além dos já citados) o mais lido era a "Lolita" de Vladimir Nabokov que o "Foz" dizia despertar-lhe outros suores, e que outros confessaram despertar-lhes sensações estranhas ao ponto de serem presa fácil da masturbação.
No meio daquele aperto de vários volumes que se acotovelavam uns contra os outros, conviviam lado a lado com a "Lolita" (sem que se deixassem seduzir), "Memed, meu falcão" de Yachar Kemal; "Para que a terra não esqueça" de Léon Weliczker; "A Rua" e a "Ponte", ambos de Manfred Gregor e um outro mais panfletário; "A Mãe" de Máximo Gorky, que o "Mogadouro" nem sequer tentava tocar-lhe, com receio que aqueles "Ventos de Leste" lhe retirassem a vontade de se alistar na GNR (como era sua intenção e que se concretizou) quando regressasse da guerra.
Tal como eu, todos aqueles livros sobreviveram àquele conflito colonial, embora mais gastos e empoeirados devido ao manuseamento um pouco desajeitado de alguns, obras que ainda hoje conservo como uma espécie de "troféus" resgatados depois de uma longa "odisseia literária", que ajudou a esquecer o isolamento apesar de teimosamente se mostrar sempre presente (...)
Carlos Vardasca
19 de Fevereiro de 2008
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