(...) Pois é! Eles sempre disseram que era uma questão de "inadaptação" (e fazendo uma pequena adaptação, aproveitando o mote do desenho que possivelmente terá outra interpretação que não a minha) que levou a que os pobres fossem ficando cada vez mais pobres, mas eles, os ricos, aproveitando-se dessa "inadaptação", fingindo ignorar as suas causas, foram ficando cada vez mais ricos, questionando-se (ingenuamente, como se não soubessem das suas origens) de onde teria vindo tanto dinheiro para os seus cofres.
Os pobres, "esses coitados inadaptados", que nunca tiveram outro remédio senão tentar gerir os seus magros salários "que se foram perdendo na profundidade dos seus bolsos e a prolongar a sua extrema pobreza" (embora o produto do seu trabalho fosse alimentando ao longo dos séculos outras vidas faustosas) foram no entanto construindo bastas vezes utopias de que um dia o mundo seria mais justo, que tudo finalmente iria mudar e que nada ficaria com dantes.
Aparentemente submissos, mas sempre prontos a explodir de revolta "como um vulcão que expele lava pela encosta da montanha", alimentando sempre a ideia de que dos seus protestos "algumas migalhas cairiam para debaixo da mesa do farto manjar", os pobres foram ao longo da história conquistando alguns dos direitos que aliviaram e melhoraram a sua própria condição humana e o direito à sua própria existência, direitos esses que agora vêem ser ameaçados por quem deles se serviu "para que também pudessem participar do farto manjar".
Sem perderem de vista quem os traiu e que aquelas "migalhas" eram apenas "sobras" mas que foram arrancadas com a luta de quem não tolerava a escravidão, os pobres, "esses coitados inadaptados", decerto que irão continuar a resistir neste mundo de injustiças e a combater arduamente para aliviar um pedaço da sua própria servidão, mesmo que "nunca lhes venham a distribuir os talheres apropriados para garantirem a sua própria sobrevivência", tomando sempre consciência de nada lhes será dado sem que resulte da sua própria emancipação.
Que 2009 desperte os ainda submissos e os traga para o seio desta imensa onda de protesto que grassa pelo mundo, onde a insubmissão rejeite de vez "as sobras do farto manjar" e continue a resistir contra "o actual mundo dos que podem" e o substitua por "um outro mundo dos que sabem".
"Que em 2009 os abraços não tenham apenas a duração de um dia"
São os votos de
Carlos Vardasca
31 de Dezembro de 2008
Desenho: in "Diário de Notícias" de 30 de Dezembro de 2008. Cravo&ferradura, da autoria do cartonista "Bandeira".
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