segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

" ... O assalto à cidadela fortificada"


(...) Foi num ápiçe que o li. Bastaram dois "pedaços" de leitura: um da parte da manhã e outro à noite, para me debruçar sobre aquelas 224 páginas e concluir com bastante agrado a leitura daquele romance. É de facto uma excelente obra. "Eldorado" não nos fala da guerra que consumiu a nossa juventude em África, mas de outra, também dramática e muito actual, e que a cada momento devolve corpos disformes, exaustos, às costas do sul da Europa, sacudidos pelas tempestades do Mediterrâneo. Fala-nos dos imigrantes do norte de África que se aventuram no "assalto à Europa fortificada", pois aí dizem encontrar os celeiros repletos enquanto nas suas barrigas se "saboreia a escassêz". Dos vários (não muitos) que já vem sendo hábito ler ao longo do ano, "Eldorado" foi o primeiro livro que li em 2008, e a sua história comovente, é uma espécie de "murro no estômago das nossas consciências", quando nos confrontamos com a atitude do Comandante Salvatore Piracci que, depois de ter passado vinte anos a patrulhar a costa Italiana na protecção das fronteiras marítimas, mas também a recolher náufragos abandonados em alto mar pelos passadores e traficantes sem escrúpulos, decide abandonar tudo e encetar a mesma viagem mas no sentido inverso.

É um livro que se recomenda. De leitura fácil, que não obriga o leitor a exercitar outras interpretações para além daquilo que está a ler, não deixando no entanto de ter uma narrativa muito sóbria e bem marcante do drama daqueles povos que "ousam meter-se a caminho para inventarem uma terra prometida"

Se aquele Comandante acabou por reconhecer que em "cada vida que salvou, houve um sonho que se desfez", então por que razão continuamos "do alto das nossas muralhas a atirar setas para aquelas ordes de invasores", impedindo-os de partilhar dos nossos celeiros e das riquezas que autrora lhes saqueámos?

Carlos Vardasca
18 de Fevereiro de 2008

"Eldorado"
Autor: Laurent Gaudé
Edições ASA
224 páginas
Preço: €12,00

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