AOS LEITORES
Não foram só os cerca de 9 000 mortos, bem
como os milhares de feridos, as únicas vítimas daquela guerra indesejada aliás,
todas o são.
Há
que levar em linha de conta as famílias daqueles militares que, de modo
diferente, também sofreram as agruras provocadas pela ausência dos seus entes
queridos, em cujas condições e perigos em que viviam lhes eram totalmente
desconhecidos. A angústia estava sempre presente: Foram as mães, as eternas e
sempre sofredoras mães, acerca das suas condições de “guerreiras” de retaguarda
já muito, felizmente, foi escrito, nós próprios o fizemos por diversas vezes; as
esposas, muitas delas já com filhos, quando os maridos partiram, enfrentando de
forma estóica a sua ausência, que, infelizmente, em muitos casos foi eterna; as
noivas, sobre estas muito pouco se tem falado e o que foi dito, logo no início
da revolução dos cravos, por pseudo escritores vanguardistas, era para atingir
a sua honra, rotulando, a grande maioria, de infiéis.
Sempre
nos insurgimos contra esta tremenda injustiça, quer em artigos que escrevemos
em revistas da especialidade, quer ainda verbalmente nas várias tertúlias em
que temos participado.
É do
conhecimento geral que durante o período atrás referido a juventude masculina era
praticamente toda mobilizada para combater nas três frentes de batalha: Angola,
Guiné e Moçambique. Mas este factor, em nosso entender, não era condição “Sine
qua non” para que a sua ausência fosse sinónimo de infidelidade por parte das
mulheres. Nos dias de ontem, de hoje e de sempre, as “traições” existiram e
continuarão a existir, não só por parte das mulheres, mas também dos homens,
porque, então, confiná-las a um período específico? Pura maldade.
Foi
ao voltar a ler essas injustas maledicências que nos ocorreu a ideia de enaltecer
essas jovens que, de forma séria, souberam esperar, também com privações de
muita ordem, pelos seus namorados ou maridos e também aquelas que por infortúnio
destes, souberam honrar para sempre a sua memória.
Devemos
confessar que o nosso propósito era, somente, abordar este tema num mero artigo
de opinião.
Mas,
com o decorrer da escrita, fomo-nos apercebendo que podíamos ir mais além do
que o simples artigo imaginado.
Assim,
nasceu nova ideia: Abalançar-nos num trabalho mais amplo, tendo sempre como
principal objectivo não fugir do pensamento inicial.
Não
obstante a história que se apresenta ser mera ficção, pelo que, qualquer
semelhança entre os nomes referidos e a realidade ser pura coincidência, o certo
é que, na verdade, a ficção ultrapassa, por vezes, a realidade.
Por
nos parecer pertinente e para mais fácil entendimento, decidimos fazer uma
breve apresentação das duas personagens principais que fazem parte desta história:
Miguel
Rapaz
mobilizado, como furriel miliciano, para combater na Província de Moçambique. Toda
a sua vida foi passada entre Vila Nova da Ribeira, de onde era natural e a sede
do Concelho, onde estudara. As suas habilitações literárias, permitiram-lhe ingressar
no Curso de Sargentos Milicianos.
Partiu
para Moçambique, deixando na terra natal uma paixão inicialmente não
correspondida. As suas lutas dividiam-se entre a conquista desse seu grande
amor e combater o inimigo na grande imensidão das matas do Niassa, onde a sua
unidade se encontrava estacionada num antigo aldeamento, já sem população,
Xituengo.
e
Mariana
Que, apesar de sempre ter vivido na sua terra
natal, era uma rapariga com alguma cultura já que os pais, que viviam do
sustento das terras, com um certo esforço financeiro, conseguiram custear as
despesas para que a filha estudasse em ensino particular na própria vila,
obtendo assim o 2.º ciclo liceal. Além disso, era uma apaixonada pela leitura.
Enquanto
não arranjava emprego na capital, era esse o seu desejo, foi permanecendo em Vila Nova da Ribeira.
Quer
Miguel, quer Mariana, dado o seu gosto pela poesia, na troca de correspondência
faziam-no, praticamente sempre em verso, embora, por vezes, a métrica
poeto-silábica não fosse cumprida com rigor. Facto perfeitamente compreensivo
dado o seu amadorismo nesta vertente literária.
“Silêncio” foi a primeira palavra que nos
ocorreu ao pensamento para dar o título a este despretensioso livro. Posteriormente,
pensámos noutros vocábulos mas, com o decorrer da escrita, o “Silêncio” foi
ganhando forma, devendo ser, no entanto, interpretado num sentido lato da
palavra e não limitá-lo a um só único significado.
Conseguimos,
assim o julgamos, pois foi esse o nosso objectivo, que Mariana fosse paradigma
e representasse as milhares de jovens que na geração de 60 e parte da de 70, que
por cá ficaram aguardando, como já referimos, privando-se dos passatempos
inerentes à sua juventude, enquanto lá longe, muito longe, se combatia.
Este
livro foi pensado também para dignificar os militares, na personagem de Miguel
que, de algum modo, tão mal tratados foram em termos de conceito por certas
franjas da nossa sociedade a qual, em certos casos, navega em termos de
opinião, ao sabor das suas próprias conveniências políticas. Estas, por vezes,
mudando de rumo de acordo com a direcção do vento.
Infelizmente,
temos que admitir que a Guerra do Ultramar foi e continua a ser para as tutelas
que nos têm e continuam a governar, um tema “maldito”.
Quer
eles queiram, quer não, isso é um facto irrefutável, a Guerra do Ultramar faz
parte da História Lusíada.
Assim,
quem nela participou, tal como nós, não deve envergonhar-se em afirmá-lo.
Mas
porquê falar dela com desprezo? Não sabemos.
Da
nossa parte continuaremos, enquanto a mente não nos atraiçoar, a escrever, sem
complexos, sobre o tema.
O Autor
3 comentários:
Quando em Maio de 71 eu trampus o limiar do RI 14, se soubesse que em Maio de 54 ja o exercito Francês sofria uma pesada derrota na Indochina que teria de abandonar com dezenas de milhar de mortos, e que seguidamente teria a guerra da Argelia, que em suma, quando a guerra começou nas colonias portuguesas ja a Africa era quase toda independente... fariam de mim gato sapato, mas mais dificilmente.
Quando em Maio de 71 eu trampus o limiar do RI 14, se soubesse que em Maio de 54 ja o exercito Francês sofria uma pesada derrota na Indochina que teria de abandonar com dezenas de milhar de mortos, e que seguidamente teria a guerra da Argelia, que em suma, quando a guerra começou nas colonias portuguesas ja a Africa era quase toda independente... fariam de mim gato sapato, mas mais dificilmente.
Quando em Maio de 71 eu trampus o limiar do RI 14, se soubesse que em Maio de 54 ja o exercito Francês sofria uma pesada derrota na Indochina que teria de abandonar com dezenas de milhar de mortos, e que seguidamente teria a guerra da Argelia, que em suma, quando a guerra começou nas colonias portuguesas ja a Africa era quase toda independente... fariam de mim gato sapato, mas mais dificilmente.
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